Sistema de equilíbrio da realidade, águas primordiais, ética, justiça, sabedoria, o feminino para além do gênero, princípio vital
Maat é a origem da vida. Nascemos com o coração de Maat, que é dado na gestação, pela gota de sangue da nossa mãe. Lá, estão todas as formas de concepção de mundo.
Maat é a experiência da própria existência. É o oceano cósmico, o princípio criativo, de tudo e de todas as coisas.
Ela é a base da ciência espiritual africana, a ordem cósmica divina – vida, natureza, herança espiritual, o todo. Não é uma ideia racional, mas o sentir-equilibrar-percorrer. Por isso, o coração é o elemento fundamental de Maat.

Na sua representação, carrega uma pena de avestruz no seu ori (cabeça), que mede nossa conexão matéria-espírito – uma referência aos sentimentos que devemos guardar na alma. Maat ou Ma’at foi encontrada pela primeira vez em Kemet, no antigo Egito. E é uma deusa preta, uma jovem deusa preta, o feminino na sua pulsão pura.
Maat não tem a ver com identidade de gênero, sexo biológico. Não é homem nem mulher, é um princípio, é a garantia de continuidade, o estabilizador do mundo, o sacro poder que fertiliza tudo.
O verbo de Maat é gestar. Ela gesta o Cosmos, o mundo, a natureza e doa às mulheres o elemento feminino capaz de gestar os filhos na materialidade. E é permanente o processo de gestar a continuidade, para além de parir crianças.

A reflexão africana sobre a concepção do ser parte de uma realidade composta de duas realidades complementares: útero cósmico se refere à energia do feminino (não ao útero biológico), de gerir, de gestão, de permanência, continuidade. Não tem a ver com ser mulher.
Mãe cósmica
A palavra ‘mãe’ surge da raiz ‘ma’, de Maat, mãe cósmica. Matrigestão é a perspectiva do feminino como um sistema organizativo para pensar a realidade do mundo não a partir do pátrio poder, do poder masculino. A cultura da África é matrifocal, matrigestora, matricentralizadora. E esse “matri” – vale insistir – não advém de mãe, mas de Maat.
Isis não é Maat
Que não se confunda Maat com Isis, as duas são deusas africanas, têm representação parecida – com suas asas abertas -, mas papéis bem diferentes nas filosofias africanas.
Isis tem o chifre de uma vaca – animal sagrado para os keméticos, os antigos egípcios – e, no meio dele, um sol, referência ao primeiro deus, o deus Rá. Ela é a deusa da fertilidade, enquanto Maat, com sua pena na cabeça, é a deusa da justiça tem a pena da justiça.
Os keméticos acreditam no Juízo Final e na Vida Eterna e a pena da justiça de Maat aparece no papiro do Juízo Final, que traz a representação do coração de um morto colocado de um lado da balança e da pena de Maat no outro. A lógica é simples: se a pena da Justiça pesar mais que o coração, quer dizer que a pessoa foi boa em vida e irá para o mundo de Osiris, da Vida Eterna. Se o coração pesar mais, significa que a pessoa não foi muito boa e não viverá para sempre.